terça-feira, dezembro 28

Esmolas

......................Daumier

Numa curta entrevista à RTPn, o Padre Feytor Pinto foi muito claro na crítica à situação da ajuda aos mais necessitados. Sem nunca o dizer claramente, condenou todo este espectáculo de caridade a que assistimos diariamente, e que tem proliferado por todo o país, e advertiu para a possibilidade de todas estas acções desviarem a atenção dos verdadeiros responsáveis pelas desigualdades sociais - pelo estado do país.
Bastaram dois anos de crise mais aguda para que o Portugal salazarento e beato, da esmola e da caridade, regressasse em todo o seu esplendor, agora com as televisões por perto.
Os nossos impostos servem para que nenhum português tenha que estender a mão.

segunda-feira, dezembro 20

Um branco puríssimo, imaculado.

No alto do Reigás o meu pai engatava a terceira, não fosse o gelo fazer das suas. No volkswagen azul levávamos o coração e as mãos a ferver de tanto brincar na neve. Descíamos cuidadosamente o monte. À terceira curva, de onde avistaríamos Vidago lá no fundo, via-se um imenso e denso nevoeiro que tudo aplanava. Era quase sempre assim: geada atrás de geada e um frio de rachar que o nevoeiro perpetuava por dias sem fim. Mas neve, em Vidago, a tão desejada neve, essa, cercava-nos à distância do desejo.
Na semana do Natal, trocávamos as brincadeiras de rua pela escolha criteriosa do pinheiro e do musgo, pela colocação das figuras de barro no presépio de novo refeito, pelo borralho da braseira onde se torrava pão, pelos cheiros dos fritos que nos avisava da proximidade da madrugada das prendas no sapatinho.
Recordo-me que o dia de consoada era longo, muito longo. O repasto, excepcionalmente mais tarde, começava com o depenicar de uns macios bolos de bacalhau. Depois, entravam as fumegantes postas de bacalhau cozido com batatas farinhentas do barroso e couve troncha passada pelo azeite e alho, que eram substituídas pela pequenada pelo polvo, também ele cozido. No fim, os doces – rabanadas de leite e água, jirimuns lambidos em suave calda de açúcar perfumada com pau de canela, línguas de abade, leite-creme bem marcado pelo ferro, pratos de aletria decorados com a mestria da minha mãe - enchiam de novo uma mesa ainda composta.
Íamos para cama muito cedo na tentativa de acelerar um relógio que naquele dia teimava em se atrasar. Depois o sonho começava ainda com os olhos bem abertos e terminava abruptamente com um safanão do meu irmão. O Pai Natal era sempre muito generoso – arranjava sempre o fim mais desejado para os nossos sonhos.
Durante a missa de Natal, contávamos aos amigos as prendas recebidas e marcávamos encontro para a única matiné do ano.
Bem, naquele Natal de 67, depois de um almoço tradicional – o divinal Cabrito Assado no Forno – entrámos para o Cine-Vidago do Sr.Germano, para ver mais um filme do Cantinflas. Eram só miúdos e a algazarra só parou ao acender das luzes coloridas que indicavam o início da projecção. As gargalhadas sucederam-se de princípio a fim e quando saímos… bem, quando saímos, fomos encontrar um incrível manto de neve de um branco puríssimo, imaculado, acabado de cair, que nos fez os miúdos mais felizes do mundo!

sexta-feira, dezembro 17

Naufrágios

Dois séculos entre o terrível naufrágio na Austrália e a pintura de Géricault. Tudo separa as imagens, mas o drama, a emoção e a artificialidade mantém-se.

sexta-feira, dezembro 10

Winners Open Source House competition

O atelier português Blaanc, em parceria com o arquitecto João Caeiro, venceu o concurso internacional Open Source House, promovido pela Enviu, innovators in sustainability (Holanda), promotora internacional de empreendedorismo sustentável, pelo projecto desenvolvido para a criação de uma habitação modelo, sustentável, flexível e de baixo custo, na Cape Coast do Gana.
João Caeiro vive actualmente em Oaxaca, no México. Dedica-se especialmente ao trabalho e formação junto das comunidades rurais, tendo vindo a desenvolver projectos sustentáveis e pesquisa direccionada para a construção com materiais locais, especializando-se em terra e em bambu. É docente na Faculdade de Arquitectura da Universidade de Oaxacadas das disciplinas de Desenho Artístico e Geometria na Faculdade de Belas Artes.

quarta-feira, dezembro 8

‘Mario, a única coisa para que serves é para escrever’”.


“Quase 70 anos depois recordo com nitidez como essa magia, traduzir as palavras dos livros em imagens, enriqueceu a minha vida, rompendo as barreiras do tempo e do espaço e permitindo-me viajar com o Capitão Nemo vinte mil léguas de viagem submarina, lutar com d’Artagnan, Athos, Portos e Aramis contra as intrigas que ameaçam a Rainha nos tempos do sinuoso Richelieu, ou arrastar-me pelas entranhas de Paris, convertido em Jean Valjean, com o corpo inerte de Marius às costas”
no Público

domingo, dezembro 5

Ó Hilária ardente


Foi no mês alumbrado dos bruxedos
o aluarado encontro.

Ó Hilária ardente,
túrgida trigueirona,
de sobrancelha sexy e gomo polpudo,

laçaste-me
com a tua boca bárbara.

Ó trémula beleza sem apoio
fiz-te pássaro e como-te no voo.

Não me culpes, amor

foi bruxaria.


Solino

sexta-feira, novembro 26

Mario Vargas Llosa, Prémio Nobel

“ - Foi uma imprudência, no seu estado ter andado a dançar assim toda a tarde, Pelirrojo – disse-lhe, com o tom mais natural do mundo, enquanto ensaboava as mãos. – Podia ter abortado. Aconselha-a a não usar cinta, e ainda menos tão apertada. Quanto tempo tem? Três, quatro meses?
Foi nesse momento que, veloz e mortífera como uma picadura de cobra, a suspeita cruzou a mente do doutor Quinteros. Com terror, sentindo que o silêncio da casa de banho se tinha electrizado, olhou pelo espelho. Pelirrojo tinha os olhos incredulamente abertos, a boca torcida num esgar que dava à sua cara uma expressão absurda, e estava lívido como um morto.
- Três, quatro meses? – ouviu-o articular, entupindo-se. – Um aborto?
Sentiu que lhe fugia a terra. “Que bruto, que animal que tu és”, pensou. E agora sim, com atroz precisão, recordou que todo o noivado e o casamento de Elianita eram uma história de poucas semanas. Afastara a vista de Antúnez, secava as mãos demasiado devagar e a sua mente procurava ardorosamente alguma mentira, um álibi que tirasse aquele rapaz do inferno para o qual acabava de o empurrar.”
In A Tia Julia e o Escrevedor de Mario Vargas Llosa

quarta-feira, novembro 10

"Votariam nela para treinadora da seleção nacional?”, perguntei.

Em Espanha, os programas de debate discutem os amores de fulana com beltrano. Há uma mulher em Espanha que é um fenómeno mediático. É famosa apenas pela sua ignorância cósmica e por dizer os maiores disparates. No entanto, uma sondagem feita numa rádio determinou que muitos espanhóis votariam nela para primeira-ministra. Na sequência disto, a rádio ligou-me para opinar sobre o assunto. “Vocês acreditariam que os mesmos espanhóis votariam nela para treinadora da seleção nacional?”, perguntei. E a resposta que obtive foi: “Não, claro que não! O lugar de treinador da seleção é um posto demasiado sério!” Ou seja, quando falamos de coisas sérias falamos de futebol, e quando falamos de política tudo é possível. Este tipo de degradação do discurso político é muito grave; e esse é o problema.

Os políticos somos todos nós. Se os políticos que ocupam os cargos são incompetentes, somos nós que os elegemos, e fomos nós, que apesar de acreditarmos que podemos ser melhores do que eles não nos oferecemos para o lugar deles.
Fernando Savater em entrevista ao Expresso

segunda-feira, novembro 8

Solução sensata

Porque se espantam os doutores da bola com a solução sensata de Jesus? Disputar o jogo no dragão em pé de igualdade com o Porto passava, obviamente, por anular o incrível Hulk. Foi isso que fizeram no último campeonato, com tão bons resultados.

quinta-feira, novembro 4

Vidago




Fotos de Luis Barreira

Os dias anteriores tinham sido de chuva copiosa, mas àquela hora e aos primeiros rasgos de Sol o contacto com o campo foi arrebatador. Eu sabia, aliás, quem conhece Vidago sabe o que o Outono desencadeia naquela terra e em particular no campo de golfe do Palace Hotel – incendeia-os. As fortes sensações provocadas pelos amarelos, vermelhos e verdes (cores que Goethe associava ao calor e à felicidade) esmagam-nos, comovem-nos. E depois o silêncio, a dimensão de tudo que nos envolve. Sim, a escala faz toda a diferença. Resignamo-nos.
Conseguiria eu renunciar a este estado de hipnose, de deslumbramento? Como poderia jogar golfe?

sexta-feira, outubro 29

No tempo de Péricles e de Sócrates

Discurso de Péricles em louvor de Atenas

“A nossa forma de governo nada tem a invejar às leis que regem os nossos vizinhos. Longe de imitar os outros, somos antes um exemplo a seguir. Em virtude do facto do Estado, entre nós, ser administrado no interesse da massa e não da minoria, o nosso regime tomou o nome de democracia. No que diz respeito aos diferendos particulares, a todos, pelas leis, é garantida a igualdade, mas no que refere à participação na vida pública, cada um obtém a consideração por virtude do seu mérito e a classe à qual pertence importa menos que o seu valor pessoal. Além disso, ninguém é prejudicado pela pobreza (…). A liberdade é a nossa regra no governo da república (…)
Sabemos conciliar o gosto pelo belo com a simplicidade, o gosto dos estudos com a energia. (…) Somos os únicos a considerar o homem que não participa na vida política como um inútil e não como um ocioso. Eis, portanto, aquilo em que nos distinguimos dos outros: sabemos dar às nossas iniciativas tanto a audácia como a reflexão.
Numa palavra, garanto eu, a nossa cidade no seu conjunto é a escola da Grécia e, quanto aos indivíduos, o nosso homem sabe dobrar o seu corpo a todas as circunstâncias com uma graça e uma destreza extraordinárias.”

Péricles, citado por Tucídides, Guerra do Peloponeso, Livro II.

terça-feira, outubro 19

Portugal Masters


Fim-de-semana em Vilamoura no Portugal Masters. Um torneio produzido por uma máquina gigantesca e eficiente do European Tour para um público maioritariamente inglês, numa terra de reformados ingleses, com um prémio chorudo pago pelos portugueses. O secretário de estado do turismo agradeceu, em inglês, aos proprietários britânicos do Oceanico Victória Golf Club a disponibilidade em receber este evento e reforçou, mais uma vez, a importância destes espectáculos na promoção do Allgarve.
Fará algum sentido promover o Algarve como região privilegiada para a modalidade quando ela é evidente aos olhos de todos os que gostam deste desporto? Saberá o sr. Secretário de Estado que países oferecem torneios com prémios semelhantes ao nosso?, e que nesses países os prémios são pagos, quase exclusivamente, por empresas privadas? Não o incomoda gastar anualmente 3 milhões de euros num torneio quando não conseguem, há mais de 30 anos, construir um campo público no Jamor?
Quanto à competição, o torneio foi muito bom, tecnicamente de grande nível, com um final emocionante.

sábado, outubro 9

Detectives Selvagens


500 páginas exigem um ritmo de leitura regular. Não consegui tempo e disposição para as múltiplas personagens deste romance tão elogiado, mas fiquei com a sensação de ter desperdiçado um bom livro,que gira à volta de um grupo de "poetas deseperados" latino-americanos ao longo de trinta anos.
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"... vinte dias depois a minha filha veio visitar-me e disse-me papá, eu não devia dizer-lhe isto, mas é melhor que o saibas. E eu disse-lhe: conta, conta, sou todo ouvidos. E ela disse: Álvaro Damián deu um tiro na cabeça. E eu disse: como é que o Alvarito pôde fazer semelhante barbaridade? E ela disse: os negócios corriam-lhe muito mal, estava arruinado, já tinha perdido quase tudo. E eu disse: mas podia ter vindo aqui para o manicómico para o pé de mim. E a minha filha riu-se, e disse que as coisas não eram assim tão fáceis."

quinta-feira, outubro 7

Vidago Palace Hotel

No JN: "Igual por fora, muito diferente por dentro. O Vidago Palace Hotel reabre, hoje, após uma profunda remodelação que lhe garantiu mais uma estrela (cinco) e o tornou membro do clube dos melhores hotéis do mundo. José Sócrates presidirá à inauguração.

Mármore de Veneza, tapeçaria do tradicional ponto de Beiriz, folha de ouro verdadeiro, tintas da conceituada Farrow & Ball…As obras de restauro do Vidago Palace Hotel, que hoje irão ser inauguradas pelo primeiro-ministro, José Sócrates, quiseram devolver a "dignidade" e a "ambição" que o rei D. Carlos queria que o edifício tivesse para então receber os membros de casas reais europeias. Por outras palavras: que o Vidago Palace Hotel fosse um "edifício do mundo", explica Rosário Pinto dos Santos, directora de vendas e marketing da G.L.A HOTELS, a multinacional que a Unicer escolheu para gerir o majestoso hotel.

Mais de cem anos depois, essa universalidade que o monarca ambicionava parece cumprir-se. O Vidago Palace Hotel foi recentemente admitido como membro permanente da Smal Leading Hotels of the World, uma marca que representa os melhores hotéis do mundo, num total de 500 unidades de luxo, espalhadas por 70 países."

domingo, outubro 3

Mia

Soubesse eu escrever e diria porque é a mais doce criatura.

Descaramento

Otto Dix


O desplante da classe dirigente não tem fim. O presidente da Caixa Geral de Depósitos (da Caixa, vejam bem!!), Farias de Oliveira, foi rápido a afirmar que serão os clientes a pagar a nova taxa que o Governo vai aplicar ao sector financeiro. Sacrifícios não é com eles. Em janeiro, e seguindo o seu exemplo, proporei aos meus alunos a redução do tempo de aulas ou o pagamento extra dos meus serviços para compensar a redução salarial.

“ Como essa pátria, tirando o povo e uns raros, é vil canalha, e mesquinha …” Jorge de Sena, 1968

domingo, setembro 26

À descoberta de (Vidago) Portugal no tempo da I República




No torreão nascente do Terreiro do Paço está uma pequena mas muito interessante exposição sobre viajantes e turistas no tempo da Primeira República. Uma colega tinha-me avisado que ia encontrar o "meu" hotel, o Palace de Vidago. Quem conhece as termas de Vidago e o restante património turístico da época esperaria que esta imponente e magnífica construção tivesse o destaque e a importância que merece. Fiquei desapontado, porque tudo o que envolveu a edificação do Hotel, do parque, a construção da linha ferroviária do Corgo (propositadamente até Vidago), etiqueta e rituais dos aquistas, esforço e dinheiro envolvidos, exigem um estudo e uma divulgação à altura. Espero com imensa curiosidade, agora que se comemoram os 100 anos da República e do Palace, a inauguração oficial do remodelado Hotel de Vidago, que se realizará no dia 6 de Outubro.

quarta-feira, setembro 15

Trapalhada


A embrulhada em que se meteram Governo, Oposição, autarquias e grupos de cidadãos contra o fim das SCUTS está a retirar-lhes a lucidez. A solução para este problema parece-me simples: acabem com as auto-estradas sem custos para os utilizadores, cobrem a quem as utiliza e beneficiem, porque era esse o propósito, as regiões mais pobres com baixa significativa das tarifas da electricidade (por exemplo, aplicar a hora de vazio da EDP durante todo o dia). Parece-me uma solução de aplicação imediata, universal, justa, combateria a desertificação, promoveria o desenvolvimento e o conforto destas regiões. Os custos seriam ridículos tendo em conta o número e poder de compra dos habitantes destes concelhos.
Intriga-me que esta solução, aparentemente tão óbvia, não se discuta.

quinta-feira, setembro 9

("Queres fazer-lhe [a uma das vítimas] alguma pergunta, Carlos?").

"A entrevista "non stop" que, desde que foi condenado, Sua Inocência tem estado ininterruptamente a dar às TVs teve o mais respeitoso e obrigado dos episódios na RTP1, canal que é suposto fazer "serviço público".
Desta vez, o "serviço" foi feito a um antigo colega, facultando-lhe a exposição sem contraditório das partes que lhe convêm (acha ele) do processo Casa Pia e promovendo o grotesco julgamento na praça pública dos juízes que, após 461 sessões, a audição de 920 testemunhas e 32 vítimas e a análise de milhares de documentos e perícias, consideraram provado que ele praticou crimes abjectos, condenando-o à cadeia sem se impressionarem com a gritaria mediática de Suas Barulhências os seus advogados, o constituído e o bastonário.
Tudo embrulhado no jornalismo de regime, inculto e superficial, de Fátima C. Ferreira, agora em versão tu-cá-tu-lá ("Queres fazer-lhe [a uma das vítimas] alguma pergunta, Carlos?"). O "Prós & Contras" só não ficará na História Universal da Infâmia do jornalismo português porque é improvável que alguém, a não ser os responsáveis da RTP, possa chamar jornalismo àquilo."

Manuel António Pina, no JN

segunda-feira, setembro 6

Mónica e o Desejo



Nos Ciclos de Cinema do DN, João Lopes recorda-nos Ingmar Bergman. No início dos anos oitenta, ainda tão marcados pelo cinema europeu, estreou Fanny e Alexander, um êxito naquela época, que me levou a descobrir algumas obras deste realizador sueco. Suécia que para nós tinha a reputação de um país próspero, evoluído e sexualmente liberal. De todos os filmes de Bergman, Mónica e o Desejo (1953) ficou na minha memória pelo dramatismo, pela complexidade das relações e, sobretudo, pela sensualidade de Harriet Andersson. Sensualidade bem expressa nesta belíssima fotografia que serve de cartaz ao filme.

sábado, setembro 4

Duas ideias muito simples e muito bem produzidas. RTP 1 e 2, aos Sábados



"Portugueses pelo Mundo mistura um programa documental com um programa de viagens. Em cada programa vemos entre cinco a sete histórias de portugueses que residem algures no planeta. As histórias de cada programa entrelaçam-se umas nas outras e são bem diferentes entre si, baseadas nas características individuais dos entrevistados, nas suas famílias, nos seus amigos, nos seus colegas de trabalho.
6 biliões como tu ("6 Billion Others") é uma tentativa de se criar um retrato contemporâneo da humanidade através de perguntas diversas, banais e universais, com diferentes pessoas de diferentes países. O que é a felicidade? Que lições aprendemos através das dificuldades da vida? Qual é o significado da vida? E da morte? 6.000 entrevistas realizadas, 65 paíse visitados, 4.500 horas de entrevistas filmadas."

segunda-feira, agosto 30

39 graus


Dos fumos da distância,
Étereos e azulados,
Surge, vertiginoso,
Um resplendor de chama.
Há fogueiras queimando
Os longes ensombrados;
Dir-se-á que o nosso olhar tudo o que toca inflama.

Teixeira de Pascoaes

segunda-feira, agosto 16

Eça de Queirós morreu a 16 de Agosto de 1900


"Basílio achava-a irresistível; quem diria que uma burguesinha podia ter tanto chique, tanta queda? Ajoelhou-se, tomou-lhe os pezinhos entre as mãos, beijou-lhos; depois, dizendo muito mal das ligas 'tão feias, com fechos de metal', beijou-lhe respeitosamente os joelhos; e então fez-lhe baixinho um pedido. Ela corou, sorriu, dizia: 'não! não!" E quando saiu do seu delírio tapou o rosto com as mãos, toda escarlate; murmurou repreensivamente:
- Oh, Basílio!
Ele torcia o bigode, muito satisfeito. Ensinara-lhe uma sensação nova; tinha-a na mão!"
Os Maias

quarta-feira, agosto 11

30 anos de sacrifício pelo futebol

Quando ouvi Alex Fergunson dizer, entre as banalidades do costume, que Carlos Queiroz "tem 30 anos de sacrifício pelo futebol", pensei que o significado da palavra sacrifício na língua inglesa não seria o mesmo da língua portuguesa. Mas é. Será que os vencimentos milionários e a opulência em que vive os dirigentes e jogadores dos grandes clubes os levam a pensar, no altruismo habitual, que renunciaram voluntariamente a algo de precioso quando escolheram este desígnio?

segunda-feira, agosto 9

Expiação

Dificilmente abandono um livro a meio. Para me defender de longas horas de enfado, a escolha das minhas leituras são criteriosas: sigo as recomendações de algumas revistas e jornais, sugestões de amigos, autores, etc.
Expiação de Ian McWean (Gradiva) foi, para muitos críticos literários, um dos melhores romances da década.

Expiação é realmente um grande livro. Tenho o filme para ver.
“- Foda-se!
A palavra que ele deixou escapar fez ricochete pela enfermaria, parecendo repetir-se várias vezes. Por detrás da cortina reinava o silêncio, ou pelo menos os sons foram atenuados. Briony continuava com o pedaço de metal ensanguentado na pinça. Devia ter uns dois centímetros de comprimento e era pontiagudo. Ouviu-se alguém aproximar-se com passos firmes. Briony deixou cair o estilhaço para a ebonite no preciso momento em que a Irmã Drummond afastou a cortina. Foi com uma expressão absolutamente calma que olhou para os pés da cama para tomar nota do nome do soldado e, eventualmente, do diagnóstico. Depois aproximou-se dele e olhou-o bem de frente.
- Como se atreve? – disse ela em voz baixa. Depois repetiu: - Como se atreve a falar assim à frente de uma das minhas enfermeiras?
- Desculpe, Irmã. Saiu-me.
A Irmã Drummond olhou com desdém para a ebonite.
- Comparados com os casos que temos visto nas últimas horas, aviador Young, os seus ferimentos são superficiais. Por isso dê-se por muito feliz. E veja se se mostra à altura do seu uniforme. Continue enfermeira Tallis. “ (p.340)

sexta-feira, agosto 6

Fui a Alvalade ver os dinamarqueses

Verde, demasiado verde. Adeptos generosos. Muitas mulheres. Um vazio de futebol, meu Deus!: Polga e Postiga, casos de polícia; Carriço, Vukcevic e Djaló, sem estaleca; Liedson fora de prazo; André Santos, Pongole e chilenos, equívocos; Maniche e João Pereira serão tragados pela mediocridade; o "mister" Paulo Sérgio, o protagonista, quer fazer-nos acreditar que com aqueles jogadores (os mesmos…, vejam bem!) lutará pelos primeiros lugares. Ah, Ah!

domingo, agosto 1

Philip Roth


As pessoas podem ser perversas, nojentas, cruéis e ao mesmo tempo fascinantes, divertidas, comoventes?

O judeu norte-americano Alexandre Portnoy consegue.


«Respira pelo nariz, faz de conta que estás a nadar.»
«Mas não estou.»
«FAZ DE CONTA!», sugeri eu, e embora ela tivesse feito mais uma garbosa tentativa, veio à tona poucos segundos depois num paroxismo de tosse e de choro. Tomei-a então nos braços (a essa rapariga linda, tão cheia de boa vontade! Que o Mozart convenceu a fazer um b***** ao Alex! Oh, tão doce como a Natacha da Guerra e Paz! Condessazinha adorável!). Embalei-a, brinquei com ela, fi-la rir, disse-lhe pela primeira vez, «também eu te amo, minha querida», mas a verdade é que se tornara para mim mais do que evidente que apesar de todas as suas qualidades e encantos – a sua dedicação, a sua beleza, a sua graça de corça, o seu lugar na história americana – eu nunca poderia sentir «amor» pela Peregrina. Intolerante com as suas fraquezas. Invejoso dos seus feitos. Cheio de raiva contra a sua família. Não, nada disto deixava grande margem para o amor. P.234
In O Complexo de Portnoy de Philip Roth

quarta-feira, julho 28

Francis Obikwelu

Qualquer país se orgulharia de ter este super atleta a defender as suas cores. Com um palmarés invejável e ainda muito novo, Francis Obikwelu escolheu ser português. Canta o hino, embrulha-se na bandeira, esforça-se por falar português. Mais: é sempre simpático e pede desculpa quando as coisas não correm bem. Mas não há vez nenhuma em que os jornalistas das televisões portuguesas nos recordem do seu local de nascimento - Nigéria, por acaso.

sábado, julho 24

Vanity Fair’s World Architecture

We asked the world’s leading architects, critics, and deans of architecture schools two questions: What are the five most important buildings, bridges, or monuments constructed since 1980? And What is the greatest work of architecture thus far in the 21st century?
Ver aqui.



domingo, julho 18

Caravaggio, génio e vilão

"Põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; chega também a mão
e põe-na no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente".

Respondeu-lhe Tomé: "Senhor meu e Deus meu! "
João 20:28

A originalidade e o carácter da sua obra consistem em conseguir uma mesma dimensão espiritual quer em cenas de costumes quer em assuntos religiosos. Caravaggio faz uma pintura próxima da vida, dos seus males, dos seus mistérios e das suas contradições. Os protagonistas das suas obras são homens comuns, representados em toda a sua simplicidade natural - foi um escândalo para a Igreja e para o próprio povo. Detentor de uma capacidade técnica de tratar as figuras num excessivo realismo, de conferir uma intensidade dramática aos assuntos e de um jogo cada vez mais contrastado de sombra e luz, Caravaggio foi, talvez, o mais significativo pintor barroco.
O comportamento intempestivo e provocante e a morte de um jovem levaram-no a abandonar Roma, vindo a morrer há precisamente 400 anos, com 38 anos.
Aqui Caravaggio na série O Poder da Arte, de Simon Schama.

sexta-feira, julho 16

O regresso das sapatilhas Sanjo


Se me perguntassem como vestia nos anos da minha adolescência diria, sem hesitação, que me sentia bem vestido quando andava com as minhas calças de ganga Lois, compradas em Verin ou Feces de Abajo, e as minhas sapatilhas Sanjo. Foi assim comigo e com uma grande parte dos meus amigos. As cores eram o branco ou preto, mas só as primeiras ficavam bem e após algumas lavagens ganhavam o tom que as faziam únicas. O design era muito original, a lona bem colada à borracha canelada, as palmilhas altas e macias tornavam-nas frescas e confortáveis, as protecções laterais dos tornozelos davam-lhe robustez. Vou comprar.