quarta-feira, julho 27

“Faça a paz, não o amor”. Amós Oz

 El País


Parecem-me oportunas as reflexões e as soluções de Amós Oz para o problema do fanatismo. Recortei daqui.

Poucos poderiam prever que o século XX desembocaria no século XI. Contudo, se o fanatismo é o sinal do desespero, Amós Oz aponta que a solução encontra-se na disseminação da esperança. Pelo menos entre os moderados, uma vez que somente os moderados de cada sociedade são capazes de combater o fundamentalismo.
Não devemos, contudo, nos ater apenas às manifestações óbvias do fanatismo.
O fanatismo começa em casa. Atitudes fanáticas ocorrem sempre que se tenta mudar um parente querido, em tese para o seu próprio bem. O fanatismo pode ocorrer quando se tenta sacrificar-se em benefício do outro, para facilitar a realização do próximo ou da próxima geração. Em geral há sempre uma tentativa de controle, de manipulação, que quase sempre envolvem a culpa. O autor afirma que entre uma mãe que diz ao filho: “termina o teu café ou mato-te!”, e aquela que diz: “termina o teu café ou mato-me”, a primeira é certamente o menor dos males, pois a segunda obriga o seu filho a viver com culpa pelo resto de sua vida.

É um erro, portanto, tentar imaginar que o amor é aquilo que irá combater o fanatismo. É exatamente o amor que gera essa busca de modificar o outro. O fanático quase sempre é um sentimentalista, que prefere sentir a pensar.

Por esse motivo, Amós Oz busca desvencilhar a ideia de amor do movimento pacifista, tendo cunhado a frase “faça a paz, não o amor”.
Mas Amós Oz não é na verdade tão pessimista assim para com as relações interpessoais. Se o fanatismo começa em casa, o antídoto também está em casa.
Para ele, de facto, nenhum homem e nenhuma mulher é uma ilha, pois todos temos a necessidade de vínculos com a família, os amigos, a cultura, a tradição, o país, a nação, o sexo ou a linguagem. Entretanto, a solução seria que as pessoas, em toda casa, toda família e toda conexão social, fossem de certa forma penínsulas: metade no oceano e metade no continente. Não seriam ilhas, tendo em vista que esse tipo de autonomia é impossível, mas manteriam seus vínculos sociais, sem buscar se alienar ao outro ou tentar modelar e obrigar o outro a adoptar o seu modo de ser.

Outra solução para o fanatismo é a criatividade, motivo pelo qual Amós Oz intitula a sua terceira conferência como O antídoto da imaginação. Se por um lado é extremamente sentimental, o fanático também peca pela falta de imaginação. O fanático em geral está profundamente influenciado pela conformidade e pela uniformidade, sendo facilmente susceptível a palavras de ordem – algo muito perceptível em regimes totalitários.

Amós Oz também aponta a literatura como um remédio possível. Apesar de admitir que as coisas não são tão simples, ler e trabalhar a consciência é um dos maiores remédios contra o fanatismo, para o qual ele indica Shakespeare, Gogol, Kafka, William Falkner, ou o poeta israelense, Yehuda Amichai, e o seu útil verso contra o fanatismo: “onde temos razão não podem crescer flores”.

Se nenhuma dessas soluções funcionarem, o único remédio possível para curar o fanatismo seria o senso de humor. Diz ele que nunca conheceu um fanático que possuísse senso de humor. Muitos possuem sarcasmo, em níveis até mordazes, mas não humor. O humor é a capacidade de rir de nós mesmos, como diz o autor: “O humor é relativismo, é a aptidão de vermos-nos como os outros podem nos ver, é a capacidade de entender que, por mais cheios de razão que estejamos e por mais terrivelmente equivocados que estejam os outros sobre nós, há sempre um certo aspecto disso tudo que é um pouco engraçado.” E, de fato, o humor pode ser uma arma extremamente eficaz para nos tornarmos imunes ao fanatismo.

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