segunda-feira, agosto 8

À beira-mar, Rentes de Carvalho


Já no século IV a. C., Platão constatara que mais cedo ou mais tarde todos temos que nos vestir. Rentes de Carvalho com a sua perspicácia e ironia habituais confirma-o na praia.

À beira-mar
Nunca fui de beira-mar ou praias, não só pelo marulhar constante, a inquietude das ondas, a brisa e a areia, mas pelo espectáculo da humanidade desnuda.
É grande o respeito que me merece o semelhante, e desde há muito considero o vestuário um dos atributos que mais têm contribuído para a harmonia da sociedade e a paz dos olhares. Daí que a praia se me afigure a versão moderna de uma Cour des Miracles medieval. Os corpos que não ferem os olhos ou os alegram, são gota de água no Oceano Pacífico da exposição praticamente nua de adiposidades, fealdades e porcalhice, de modo que uma passagem pela praia – as minhas só por razões de ofício – tem consequências graves para o sossego da alma, o sono da noite e o respeito que devo ao próximo.
Enquanto tenho de estar e presenciar, incomoda-me a passividade daquela massa que, espichada ao sol, involuntariamente provoca a imaginação de horrendas cópulas, hábitos vis, atitudes indecentes, satisfações alvares, peidos e arrotos.
Dêem-me a rua e a roupa.


Rentes de Carvalho, aqui

1 comentário:

  1. Não conheço suficientemente o pensamento de Rentes de Carvalho, para emitir uma opinião sobre o mesmo. Contudo, o presente excerto parece-me indiciar um espírito com alguma perversidade. Não é a ausência de roupa que é indecente, mas sim a mente de quem a observa...

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