quinta-feira, abril 29

A Natureza-Morta na Fundação Calouste Gulbenkian

É sempre com enorme prazer regressar à Fundação. Os jardins estão magníficos e a exposição é belíssima. A Natureza-Morta na Europa está em exibição até 2 de Maio e explora os temas recorrentes da natureza-morta ao longo da história: frutos, caça, cozinhas, pintura de flores, Vanitas e obras em trompe-l'oeil.
Já na Antiga Grécia, um dos critérios para avaliar uma pintura era a semelhança com o real - mimesis. Conta-se que o pintor Zeuxis foi louvado por pintar uvas tão realistas que os pássaros vinham debicá-las porque as confundiam com frutos verdadeiros. O próprio Zeuxis também se deixou enganar ao tentar abrir uma cortina pintada pelo seu rival Parrhasius.

Cornelius Gijsbrechts, Reverso de um quadro, 1670

sexta-feira, abril 23

Dia Mundial do Livro

Dias da Música e You Tube

Começam hoje no CCB Os Dias da Música. Numa edição anterior, e ainda sob o nome de Festa da Música, dedicou o evento à Europa Barroca. Em parceria com o Público, promoviam a festa lançando um CD com uma selecção de músicas da época. A escolha era criteriosa e interpretada pelos melhores músicos contemporâneos. Desse magnífico CD, que eu oiço repetidamente, recorto este excerto de Handel, Dixit Dominus. (Com o som bem alto, os 2 primeiros minutos da parte 4 são magníficos.)
Recorro ao YouTube, que nesta sexta-feira comemora precisamente cinco anos desde que publicou o primeiro vídeo e que nos tem proporcionado o acesso a uma incrível variedade de conteúdos.

quinta-feira, abril 22

Paula Rego


“Como essa pátria, tirando o povo e uns raros, é vil canalha, e mesquinha …”

Jorge de Sena, 1968

segunda-feira, abril 19

6ª edição do World Press Cartoon




Gabriel Ippóliti, Argentino
Angel Boligán, Mexicano
Hassan Karimzadeh, Irariano

Toda a gente fala sem cessar

«O que acontece aos outros, as infelicidades, as calamidades, os crimes, tudo isso nos é alheio, como se não existisse. Inclusivamente o que nos acontece a nós nos parece alheio depois de já ter acontecido. Há quem seja assim toda a vida, eternamente jovem, uma infelicidade. Uma pessoa conta, fala, diz, as palavras são grátis e saem aos borbotões às vezes, sem restrições. Continuam a sair em qualquer ocasião, quando estamos bêbedos, quando estamos furiosos, quando estamos abatidos, quando estamos fartos, quando estamos entusiasmados, quando nos sentimos apaixonados, quando é inconveniente que as digamos ou não podemos medi-las. Quando fazemos mal. É impossível não nos enganarmos. O mais estranho é que as palavras não tenham mais consequências nefastas do que as que normalmente têm. Ou talvez não saibamos suficientemente, julgamos que não têm tantas e é tudo um desastre perpétuo devido ao que dizemos. Toda a gente fala sem cessar, a cada momento há milhões de conversas, de narrações, de declarações, de comentários, de bisbilhotices, de confissões, são ditos e ouvidos e ninguém os pode controlar. Ninguém pode prever o efeito explosivo que causam, nem sequer segui-lo. Porque apesar de as palavras serem tantas e tão baratas, tão insignificantes, poucos são capazes de não fazerem caso delas. Dá-se-lhes importância. Ou não, mas ouviram-se.»
In Coração tão branco de Javier Marías, p 262.

Desenho de Jillian Tamaki

terça-feira, abril 13

"Verão" antecipado

John Coetzee por Joe Ciardiello

Li com enorme prazer o último livro de John Coetzee, Verão. É o terceiro da trilogia de memórias ficcionadas do autor que ganhou o Prémio Nobel da Literatura em 2003. É muito original: conta várias histórias de uma fase da sua vida, entre os 30 e 40 anos, a partir de perspectivas de diferentes pessoas com quem conviveu.
Um recorte:
“A razão por que não investi mais a fundo no John tem muito que ver, suspeito actualmente, com o seu projecto de se tornar aquilo que lhe descrevi, um homem gentil, o tipo de homem incapaz de fazer mal, nem sequer a animais irracionais, nem sequer a uma mulher. Hoje penso que devia ter sido mais clara com ele: Se por qualquer razão estás a retrair-te, não o faças, que não é preciso! Se eu lhe tivesse dito isso, se ele o tivesse levado a peito, se ele tivesse permitido ser um pouco mais impetuoso, um pouco mais imperioso, um pouco menos atencioso, talvez me tivesse mesmo conseguido arrancar de um casamento que era mau para mim e ainda se tornaria pior. Podia ter-me mesmo salvo, ou salvo por mim os melhores anos da minha vida, que afinal foram desperdiçados.”p.69
In Verão de J. Coetzee

domingo, abril 11

Simon Schama


Começa assim:
" Poderei indicar-vos o preciso momento - com um ou dois minutos de diferença - em que a democracia americana ressuscitou, uma vez que o presenciei: foi às 19h45, Hora da Europa Central, do dia 3 de Janeiro de 2008, no círculo eleitoral 53, da Escola Secundária Theodore Roosevelt. Sei porque consultava regularmente o meu rlógio de pulso e não conseguia deixar de olhar para o velho relógio de parede da sala de aula, com o mostrador branco, alvo de ódio e da ansiedade de gerações e gerações de adolescentes."
Sugestivo, não acham? O mais recente livro do historiador inglês, revê a história dos Estados Unidos a partir dos temas da guerra, da religião, da imigração e da abundância.

Simon Schama é também o autor da fabulosa e imprescindível série O Poder da Arte.

sexta-feira, abril 9

"A minha cabeça podia ter estoirado"

Para lá de um desporto tecnicamente muito difícil, o golfe exige disciplina, concentração, controlo emocional. O golfe torna-nos mais humildes. Competimos contra outros jogadores, contra o campo e, sobretudo, contra nós próprios! Todas as pancadas são da tua inteira responsabilidade: se está no meio do fairway, no green ou no arbusto mais denso, foste tu que a colocaste lá. E isso custa! Somos humilhados vezes sem conta. E voltamos sempre, na procura, quase sempre vã, de nos apaziguarmos.

quarta-feira, abril 7

Messi e Fred Astaire


Se leram a crónica de Ferreira Fernandes, faz sentido colocar este video e saltar de imediato para o Masters em Augusta, a decorrer de 8 a 11 de Abril. Quem joga golf percebe que o swing de Fred Astaire é perfeito e intemporal.

"Dios vive en Cataluña"


Ler opinião de Ferreira Fernandes no DN.

sábado, abril 3

Fosso excessivamente grande

Fotografia do jornal i

José Mattoso em entrevista ao DN:
Estes últimos 35 anos foram um tempo perdido?

"Deveríamos ter feito mais, mas não sei se o poderíamos. Basta ver a enorme diferença entre ricos e pobres! Parece haver uma dificuldade na redistribuição e rentabilização dos recursos. Existe um fosso excessivamente grande para o que deveria ser a nossa realidade e que se traduz na grande dificuldade de as classes mais populares acederem à cultura."

sexta-feira, abril 2

"Estou bem com a minha consciência!"

Korperwelten

"Estou bem com a minha consciência!"
Expressão usada vezes sem conta num país encharcado de ansiolíticos, hipnóticos e sedativos, mas bem com a sua consciência.
Recordo um poema de Fernando Pessoa (Álvaro de Campos).



Poema em linha recta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.