«Lá em cima, as mulheres gritaram, através das janelas, sem
saber já se o faziam em proteção de uns ou de outros.
No momento em que espreitou pelo postigo, com a espingarda
na mão, o rapaz percebeu que o pai se encontrava já em cima de um cavalo, com
as mãos atadas atrás das costas e a corda à volta da cabeça, três dos homens de
capuz segurando o animal e invectivando-o com insultos e ameaças. E, ao vê-lo,
gritou, ergueu a arma, muito atabalhoado, e disparou numa direcção indefinida.
O cavalo foi o primeiro a reagir, erguendo as patas da
frente e partindo a galope quinta acima. Os encapuzados desataram a correr,
muito atarantados, como se disso dependessem as suas próprias vidas. Álvaro
Augusto Silveira-Goulart, esse, ficou pendurado pelo pescoço, a sacudir-se num
estertor, e depois apenas a balançar-se ao sabor do vento e da gravidade, já
inerte, com um estranho sorriso na boca.
Elias puxou uma fumaça do seu cigarro grosseiro, agora já
reduzido a uma ponta apenas. Bateu a cinza no cinzeiro.
- Um desses homens era João de Brito Carreiro, empregado da
casa.
José Artur cruzou os braços, num tom de desafio.
- Outro era o Ti Elias.
O velho fitou-o de volta. Fez um gesto com a cabeça.
- E o outro era o teu avô José Guilherme.»
Arquipélago, Joel Neto
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