Enviou-me duas fotografias da avó Felisbela. Penso cada vez menos nela, apesar de no meu quarto ter uma fotografia em que ela, ainda jovem, ocupa o centro da família. De tão próximas, as fotografias que temos nas paredes das nossas casas acabam por diluir-se. Com esta não será assim.
Numa das fotografias que me enviou, a minha avó posa para o neto mais velho, meu irmão, sentada na ponta de um dos cadeirões da sala de jantar. Ereta, blusa de seda branca com triângulos pretos, olhar direto no primeiro terço da folha, perfil parcial, sorriso forçado, cabelo cuidado, mão esquerda em cima do joelho - o modelo, a professora Felisbela, seguindo as indicações do cânone do retrato clássico. Não fosse a minha avó ali naquele ambiente familiar e os meus olhos nada reteriam.
Mas a primeira que me enviou, esta que vos mostro, tenho a certeza que o comoveu tanto quanto me comoveu a mim. Senti uma saudade imensa. Fez -me lembrar o autorretrato de Rembrandt, de 1669, ano da sua morte. O mesmo rosto cansado, a serenidade estampada no olhar, a luz perfeita de tons suaves do final de tarde, o claro-escuro meigo reflexo da sua maneira de ser, a mesma dignidade, o olhar introspetivo que me emociona.
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