sexta-feira, novembro 26

Mario Vargas Llosa, Prémio Nobel

“ - Foi uma imprudência, no seu estado ter andado a dançar assim toda a tarde, Pelirrojo – disse-lhe, com o tom mais natural do mundo, enquanto ensaboava as mãos. – Podia ter abortado. Aconselha-a a não usar cinta, e ainda menos tão apertada. Quanto tempo tem? Três, quatro meses?
Foi nesse momento que, veloz e mortífera como uma picadura de cobra, a suspeita cruzou a mente do doutor Quinteros. Com terror, sentindo que o silêncio da casa de banho se tinha electrizado, olhou pelo espelho. Pelirrojo tinha os olhos incredulamente abertos, a boca torcida num esgar que dava à sua cara uma expressão absurda, e estava lívido como um morto.
- Três, quatro meses? – ouviu-o articular, entupindo-se. – Um aborto?
Sentiu que lhe fugia a terra. “Que bruto, que animal que tu és”, pensou. E agora sim, com atroz precisão, recordou que todo o noivado e o casamento de Elianita eram uma história de poucas semanas. Afastara a vista de Antúnez, secava as mãos demasiado devagar e a sua mente procurava ardorosamente alguma mentira, um álibi que tirasse aquele rapaz do inferno para o qual acabava de o empurrar.”
In A Tia Julia e o Escrevedor de Mario Vargas Llosa

quarta-feira, novembro 10

"Votariam nela para treinadora da seleção nacional?”, perguntei.

Em Espanha, os programas de debate discutem os amores de fulana com beltrano. Há uma mulher em Espanha que é um fenómeno mediático. É famosa apenas pela sua ignorância cósmica e por dizer os maiores disparates. No entanto, uma sondagem feita numa rádio determinou que muitos espanhóis votariam nela para primeira-ministra. Na sequência disto, a rádio ligou-me para opinar sobre o assunto. “Vocês acreditariam que os mesmos espanhóis votariam nela para treinadora da seleção nacional?”, perguntei. E a resposta que obtive foi: “Não, claro que não! O lugar de treinador da seleção é um posto demasiado sério!” Ou seja, quando falamos de coisas sérias falamos de futebol, e quando falamos de política tudo é possível. Este tipo de degradação do discurso político é muito grave; e esse é o problema.

Os políticos somos todos nós. Se os políticos que ocupam os cargos são incompetentes, somos nós que os elegemos, e fomos nós, que apesar de acreditarmos que podemos ser melhores do que eles não nos oferecemos para o lugar deles.
Fernando Savater em entrevista ao Expresso

segunda-feira, novembro 8

Solução sensata

Porque se espantam os doutores da bola com a solução sensata de Jesus? Disputar o jogo no dragão em pé de igualdade com o Porto passava, obviamente, por anular o incrível Hulk. Foi isso que fizeram no último campeonato, com tão bons resultados.

quinta-feira, novembro 4

Vidago




Fotos de Luis Barreira

Os dias anteriores tinham sido de chuva copiosa, mas àquela hora e aos primeiros rasgos de Sol o contacto com o campo foi arrebatador. Eu sabia, aliás, quem conhece Vidago sabe o que o Outono desencadeia naquela terra e em particular no campo de golfe do Palace Hotel – incendeia-os. As fortes sensações provocadas pelos amarelos, vermelhos e verdes (cores que Goethe associava ao calor e à felicidade) esmagam-nos, comovem-nos. E depois o silêncio, a dimensão de tudo que nos envolve. Sim, a escala faz toda a diferença. Resignamo-nos.
Conseguiria eu renunciar a este estado de hipnose, de deslumbramento? Como poderia jogar golfe?