segunda-feira, novembro 20
domingo, novembro 5
Nelson Rodrigues, por Ruy Castro
Biografia aclamada por críticos e leitores. Uma referência para todos os biógrafos. Pontuações máximas. Uma grande expectativa que não saiu gorada. Já li algumas biografias, mas nunca alguma que se assemelhasse.
«Ninguém é exatamente velho aos 49 anos, mas Nelson
aparentava muito mais. Era lento de gestos, pesado, sedentário. Sua fala era
uma espécie de mugido arrastado, a ponto de pensarem que vivia bêbado – ele,
que nunca pusera uma gota de álcool na boca. Quando se empolgava, a voz ganhava
outra tonalidade e as sílabas quase se atropelavam, mas isso era raro, porque Nelson
parecia carregar uma tristeza perene. Quando se sentava para escrever, os
ombros caíam e ele, que não era baixo, encolhia. A visão dos suspensórios
também não ajudava. O que pareciam traços de beleza na juventude tinham sido
devastados pelos abalos da saúde e pelo seu estilo de vida – o rosto magro e
bem desenhado lembrava agora um buldogue. E Nelson era publicamente doente.
Todos sabiam que era que era tuberculoso e ele próprio encarregava-se de
promover sua úlcera como se ela fosse Maria Callas. Era cardíaco, precisava de
se cuidar. Tinha uma enxaqueca permanente, comum a toda a sua família. E sofria
também de hemorróidas.
Quando Lúcia revelou a história a suas amigas no Country e
nos lugares sofisticados que frequentavam, elas não acreditaram. Como podia
interessar-se por um homem tão mais velho, feio, doente, relaxado, certamente
cheio de manias e, para piorar, casado – por mais inteligente e fascinante que
fosse? O choque dos amigos de Nelson não foi menor.»
O Anjo Pornográfico, Ruy Castro
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